sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Foi o mundo então que cresceu?

Eu escrevi esse texto já faz um tempo, foi quando o Saramago morreu. Mas achava que estava faltando alguma coisa e não publiquei. Dei uma ornada agora e... aí vai.

Estava rolando no twitter a frase: “A literatura nunca esteve tão morta. De um lado morre Saramago, de outro Geisy Arruda lança um livro”.

A literatura já está em fase terminal já faz algum tempo, na verdade. Que fique bem claro, sou contra qualquer tipo de generalização, mas eu concordo: nunca foi tão difícil encontrar algo que se salve em meio a tanta porcaria.
O conceito da arte pela arte foi diluído.

Já diria Schopenhauer que a arte – no caso, ele fala especificamente da ciência (em ‘A Arte de Escrever’, livrinho minúsculo que recomendo) - deve ser produzida não como um meio, mas como um fim. Tudo o que fosse feito visando a algo além do puro prazer de fazer a arte ou produzir o saber podia ser jogado junto a cascas de banana.

Dizia isso, creio eu, porque ninguém apreciava suas obras, então aproveitava pra meter o pau em quem conseguia ganhar dinheiro com o que escrevia. Inclusive, apostou que só iam gostar dele depois de morto. Acertou.

Mas tinha algum fundamento no que ele dizia. O espírito capitalista e a indústria cultural (rótulos como frankfurtiana, marxista ou qualquer coisa do tipo, não, por favor) massificaram e, de certa forma, banalizaram todo e qualquer tipo de produção artística. Quer dizer. O que é arte agora é produto, e apenas é arte em função do preço que tem. Repito: o conceito da arte pela arte foi diluído. Ela não é feita por ser feita, mas para ser recompensada. Chico disse (mesmo que diga que não lembre) que, ou a gente estancou, ou o mundo cresceu.

Ao meu humilde ver, o principal agente disso foi, sim, o mundo, e acho que, longe de estagnar, a gente cresceu com ele. Ou não... depende do significado que cada um atribui a “crescer”. E a “evoluir”. Apoio as teorias naturalistas nesse ponto – já que estamos falando de literatura. Acho que o homem é feito das influências do meio e tudo mais. Mas o meio é também uma influência do homem. O meio cresceu, mas só porque o homem cresceu antes. E o homem cresceu, na verdade, espelhado nos outros homens? Que constituem o meio? Quem veio primeiro, o ovo ou a galinha? Entendeu por que ‘Roda Viva’? Mas aí é uma viagem muito grande, deixa quieto ou pra outro post. Fugi muito, voltando...

As prioridades mudam. Desencana de conhecer outro Pessoa, outra Espanca, quanto mais outro Da Vinci. As pessoas agora têm mais o que fazer além de passar a vida analisando a sociedade, rimando dor e amor e pintando amadas e auto-retratos. Não é ruim isso, é só diferente (contradisse totalmente agora o que eu falei lá em cima, né?).

A produção tecnológica é o que representa hoje as prioridades, e não mais a arte, a cultura em seu sentido mais puro. Ela é nojenta e aliena em vários níveis, mas, sinceramente, tem sua beleza. A arte era o que unia as pessoas em tempos remotos, e a tecnologia foi o jeito que o homem achou de recuperar isso – e cá entre nós, ela sai na vantagem: dispensa a criatividade, o talento nato – se é que ele existe – e, ao mesmo tempo, dá as boas vindas à subjetividade que nela quiserem pôr.

A internet, com toda a sua capacidade de banalizar TUDO, consegue sempre – e sempre de modo inovador – salientar seu lado positivo: o da sua política inerente de liberdade de expressão e informação.

Outros meios de expressão – geralmente lapidados em papel – procuram manter a tradicionalidade de certas coisas. Andam paralelamente à constante evolução da mídia, – não adianta, são obrigados – mas seguram aquilo que lhes resta do tradicional.
E a Veja, que ultrapassa os limites do conservadorismo, vem e me publica Cala Boca Galvão na capa e ¼ de página lá no meio dedicado à morte do Saramago...

7 comentários:

  1. faz tempo que essa banalização de tudo é feita pela internet, mas a internet são 4 camadas e a última são as comunidades virtuais, se a capa da veja publica CALA BOCA GALVAO na Capa, foi porque nós alimentamos isso, e falamos disso 24 horas por dia, a veja apenas lançou o que iria vender mais, iria ser lido mais, ninguem tá nem aí pro saramago, ele morreu? achei que já tinha morrido...quem é ele? sabe?
    o problema não está na mudança dos tempos, o problema está na falta de capricho do ser humano para criar sua arte, andy warhol tem um pouco de culpa nisso, entende? depois dele, vamos ganhar dinheiro com qualquer coisinha!! falta capricho, falta arte pela arte realmente, mas acima de tudo falta vergonha na cara perante aos PESSOA, AOS DA VINCI, etc.

    Parabéns pelo seu texto, faz pensar isso é legal

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  2. Era exatamente esse o meu ponto. O produto da Veja é direcionado ao leitor, melhor, ao comprador. O próprio nome já diz: produto. Duh... Não é uma crítica, e concordo plenamente com você. A mudança dos tempos é totalmente positiva, mas tudo agora é o mais fácil, é do jeito mais simples. De novo: não é uma crítica, mas um comentário. O twitter, por exemplo, é a prova mais irrefutável disso. Um limite de 140 caracteres para a sua criação.

    Brigada pelo comentário, Guil! Beijo

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  3. Desde a época em que o Homo sapiens sapiens começou a falar, até o dia em que a Terra se tornar inabitável para o ser humano, sempre houve, há e haverá alguém dizendo: "Os tempos de hoje não são mais como antigamente".
    Volta e meia, eu me pego cometendo esse erro, ao dizer que "as músicas dos anos 60 eram muito mais melódicas". Naturalmente, quando comecei a cantar Beatles e Led Zeppelin, os mais velhos diziam que "aquilo não era música de verdade" e sentiam saudades dos bons tempos de Big Bands e congêneres.
    Não creio que o mundo tenha crescido ou que as mentes tenham diminuído. As coisas não estão nem melhores nem piores do que antes, estão apenas diferentes. Adoro reler obras como "O Alienista", mas isso não significa que hoje não existe mais a arte de Machado, nem quer dizer que todos os contemporâneos dele eram artistas, haja vista que só os bons continuam a afetar o nosso imaginário. Da mesma forma, não creio que Dan Brown será lido daqui a 100 anos, mas posso apostar que John Steinbeck, Tennessee Williams, Gore Vidal e Truman Capote serão matéria obrigatória nos cursos de Letras. Em suma, o bom fica, o apenas adequado desaparece aos poucos, e o inadequado é bem efêmero.
    Ah, aquela noite em 67!... Lá estava eu em casa com os olhos grudados na Record, babando ao ouvir aquelas músicas inesquecíveis, e é claro que hoje sinto saudades. Mas dou o mesmo valor, por exemplo, a Jason Mraz, e digo: "Que poesia... que arte..."
    E discordo de Schopenhauer, a literatura também pode ser um meio, no sentido de inspiração, educação, incentivo, divulgação de novas ideias, ou apenas para instigar o pensamento coletivo, seja como reflexo da época ou como início de um novo Zeitgeist.
    Ah, como eu NÃO tenho saudades dos tempos em que não existia a Internet (e blogs provocantes)...

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  4. exatamente, Laet, os tempos estão apenas diferentes, e por isso que eu falo que o que falta é capricho nas coisas, hoje é muito fácil você fazer uma música e colocá-la na internet pra todos ouvirem, e as pessoas sabendo disso, dessa interação virtual, dão mais valor às bizarrices e as promovem massivamente no twitter e enfins. Não tenho AQUELA saudade da época sem internet, até porque, isso foi até os meus 5, 6 anos, mas eu tenho saudade de quando eu não a sabia utilizar, porque assim eu me afundava em livros, em filmes, e hoje perco grande parte do meu tempo nas comunidades virtuais, mas sei, é claro, que posso aprender muito com a internet, aprender muito mais facilmente do que indo a uma biblioteca procurar um livro, e é por isso que falo que ainda não sei usá-la. acredito que a internet é um instrumento perigoso do século, talvez a arma mais perigosa já criada, mas saber fazer este perigo se tornar uma virtude, uma bandeira branca é o nosso maior desafio. eu não vivi a década de 60 e 70 mas as vezes fico até mal pensando que nasci na época errada. mas aí vem gente dizendo que foram décadas dolorosas de repressão etc. eu sei disso, mas hoje não sentimos dor, não sentimos repressão, não temos causas, e sofremos mais, bem mais, sem saber o porque. viajei, né? desculpa

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  5. Decidi voltar a comentar hoje, 3/10, o primeiro turno da eleição, porque algo me fez recordar este nosso diálogo sobre o possível decréscimo da cultura em seu todo e da literatura em particular. Li um tweet sarcástico sobre Geisy Arruda, e isso me fez lembrar da época em minha juventude quando algo similar aconteceu, ou seja, um "finger-licking scandal" que resultou num livro.
    O caso foi um suposto affaire entre o governador de SP Jânio Quadros e uma mulher chamada Adelaide Carraro. Ela escreveu o livro "Eu e o Governador", e tanto a imprensa como o público se deleitaram com o caso, nos mesmos moldes que vimos com a Geisy.
    Porém, Adelaide ganhou seu primeiro prêmio em literatura aos 13 anos, escreveu cerca de 40 livros, e seria impossível estabelecer um paralelo entre ela e Geisy.
    Assim, lá estava eu mais uma vez cometendo o erro de criticar o presente e exaltar o passado:
    "Na minha época, Adelaide Carraro e Truman Capote. Hoje, Geisy Arruda e Dan Brown..."
    Repito que isto é uma visão túnel, na minha época também havia merdas indescritíveis e sei que hoje há muita coisa louvável.
    Eu só queria reforçar este ponto.

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  6. Concordo com o Laet, exceto na comparação entre D. Brown e Geisy Arruda com Adelaide Carraro, hahah.
    Não acredito que a internet esteja "banalizando tudo", incluindo a arte.
    Aliás, a "arte" que aguardamos hoje é a arte do passado; um dogma - sabemos que é arte, mas não o porquê - Coli exemplifica bem isso quando comenta sobre
    a denominação dos "estilos de arte". Não é muito supérfluo caracterizar algo apenas por poucas características marcantes deixando de lado os detalhes que realmente o tornam arte? - Leia-se interpretação.
    Enfim, não é sobre isso que seu texto trata.
    Acredito que eu seja o mais jovem dentre os comentaristas do blog, mas não é só por isso que vejo a digitalidade como oportunidade. Não só de comércio, mas também, de evolução - também na arte.
    Tudo é novo a toda hora. Hoje, temos 100 anos em um dia. As descobertas das novidades inpensadas antigamente tornam-se realidade em segundos.

    Continuamos afirmando a banalização da arte em plena era digital porque não estamos acostumados com o "tudo novo a toda hora", porém, acostumaremo-nos um dia e saberemos apreciar os frutos da alta-tecnologia e alta-definição (no que diz respeito à saturação de dados).

    O culpado da arte banalizada não é o artista latente, e sim, quem o patrocina - a não ser que seja ele seu próprio patrocinador. A segunda colocação seria "estranha", "impensável" ou "vergonhosa" se fosse colocada há tempos atrás. Porém, atualmente, autopromover-se está na moda - YouTube. Exemplos? (Hahahah) Pecê Siqueira, Felipe Neto, Restart. Para começar, nenhum dos dois primeiros nomes me levam a pensar em arte. Restart pode até fazê-lo por se tratar de música, mas é uma arte "com a qual não estou acostumado". Se algum dia irei colocar o estilo de música da banda como arte, eu não sei. Mas sei que há quem goste e que a maioria do público que a aprecia faz parte da geração digital que bombardeará ainda mais o mundo com mais tecnologia.
    Há, sim, os que optam pelo mais simples. Aliás, pensar menos está na moda. Tem quem faça isso por você - Google. Sempre foi assim e continuará a ser. Os que se destacaram/destacam/destacarão foram/são/serão os que andaram/andam/andarão na contramão. Que fogem do simples, exploram a fundo e se interessam mais.

    Na minha opinião, 140 caracteres é mais do que o necessário para a idealização de uma genealidade. Não absoluta nem profunda, mas uma apresentação interessante que a torne explorável.

    Hoje a tecnologia nos confunde e nos faz pensar em barbaridades refletíveis, anteriormente irrefletidas devido à não-existência da mesma. A arte está sob um intenso processo de mudança, e logo, logo saberemos lidar com a "nova arte".

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  7. Não tinha pensado na tecnologia como algo que se uniria à arte e a promoveria, mas sim que se sobreporia. E justamente, a idéia do meu texto foi passar um questionamento, não afirmar que a tecnologia e os tempos modernos estão acabando com a nossa “arte”. Afinal, como diria o próprio Jorge Coli, a "arte" carrega as marcas deixadas pelo “não-racional” coletivo histórico.
    Quem somos nós pra dizer que o que era produzido dois séculos atrás era arte e o que é agora não é? Já foi mais que provado que o que define uma obra de “arte” não é o seu conteúdo (vide Dada, Pop-art, Duchamp, etc), mas sim seu caráter social. Então sim, Popoh e papai (rs), vocês estão totalmente certos. Se o que define e caracteriza nossa sociedade hoje em dia é a internet, ou, de forma mais geral, a tecnologia, a arte deve ser algo que se adapte a ela (citando seus próprios exemplos: Felipe Neto e PC Siqueira).
    O mais difícil é conseguir discernir aquilo que é “arte”, o que é “bom”, o que é “digno de ser consumido”, ou considerado “cult” daquilo que não é nada disso. Se é que existe essa fronteira. Por que Capote é tudo isso e Dan Brown não?
    Acho que vale destacar o fator efemeridade. Os Beatles não são minha banda preferida, longe disso. Porém, eles estão aí até hoje. Pode ser preconceito, pode. Mas ponho minha mão no fogo pra apostar que Restart não terá a presença que os Beatles têm daqui a 50 anos. É arte? Não sei, pode ser. Por que não? É esse o meu ponto.
    Mas será que aprenderemos a lidar com a “nova arte”, Popoh? Ou surgirá uma “mais nova arte” e aí será a “nova arte” que passará a ser considerada “arte”?

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